Dying Days
Seu browser está com uso de JavaScript desativado. Algumas opções de navegação neste site não irão funcionar por conta disso.

Discos do mês - Fevereiro de 2022

Fabricio C. Boppré |
Discos do mês - Fevereiro de 2022

Big Thief - Dragon New Warm Mountain I Believe In You

Eu ignorava completamente a existência desta banda quando comecei a ler seu nome por todos os lados, nos blogs e até mesmo no único jornal que leio, e os elogios e louvores eram sempre tão profusos que tratei de escutá-la. Os dois discos que encontrei por aí, no entanto, inicialmente falharam em me entusiasmar. Veio então a notícia de que o novo álbum do Big Thief seria duplo e isso imediatamente recarregou minha curiosidade. É a minha velha atração pelos discos duplos: artistas e bandas convencidas de que têm talento e material (ou pode ser só presunção mesmo) suficientes para ocupar ininterrupta hora e meia da vida de alguém têm imediatamente meu respeito. E Dragon New Warm Mountain I Believe In You finalmente correspondeu, foi paixão à primeira escutada. São 20 faixas — 20 pequenas e memoráveis faixas, cada uma delas, sem nem uma exceção sequer. A sonoridade brinca freqüentemente com a música caipira norte-americana e devo confessar que sempre achei meio estranho (para dizer o mínimo) alguém não nascido nos EUA gostar de country ou mesmo do tal alt-country, porém, em minha defesa, posso dizer que escutei muito Rolando Boldrin na infância e tenho ternas lembranças disso… Em todo o caso, Dragon New Warm Mountain I Believe In You não é apenas Americana; são muitas as faixas que nós adultos globalistas ou globalizados podemos apreciar sem que sejam necessárias escusas ou justificativas. A canção de abertura, Change, já para começar é exuberante, o tipo de beleza simples e superior que o R.E.M. atingiu com o Automatic for the People, por exemplo — beleza plácida, madura e inquestionável, que parece desaguar de algum lugar que pouquíssimos artistas têm acesso. E o disco segue neste altíssimo nível até o fim, às vezes algo instável — como uma banda afiada ensaiando em um momento de grande inspiração e espontaneidade, o tempo todo correndo o risco de despedaçar a canção em andamento mas seguindo sempre em frente — e não poucas vezes comovente e deslumbrante, mesmo em seus confins, em suas últimas faixas. Tenho escutado-o diariamente, e sempre que o álbum acaba não há muito mais o que eu consigo ouvir pelas próximas horas: resta-me apenas voltar aos meus discos mais queridos e reconfortantes, às vozes mais familiares, ao R.E.M., aos discos solos do Mark Knopfler, ao Laughing Stock. Acho que o Big Thief acabará por se juntar a esta turma de ilustres e Dragon New Warm Mountain I Believe In You será um álbum para ouvir para o resto da vida.

a-ha - Hunting High and Low

Este é o mais eficiente portal para os anos 80 de que tenho notícia. Nos dias que correm, não é um recurso que se possa desprezar... Sentimentalismo saudoso à parte, talvez exista algo a ser dito sobre a música de Hunting High and Low. Estarei muito equivocado ao sugerir que se trata de uma das mais inventivas e arrojadas coleções de usos de sintetizadores, teclados e drum machines jamais registrada em disco? Um dos mais bem-sucedidos exemplares deste tipo de som meticulosamente criado em estúdio, ao menos enquanto a serviço da música pop juvenil? Ou será que confundo arrojado, inventivo e bem-sucedido com extremamente desavergonhado e exageradamente descomedido? Penso principalmente em The Blue Sky, Living a Boy's Adventure Tale e The Sun Always Shines on T.V., faixas que soam quase como mini-operetas ilustrativas de uma época, de sua música, sua euforia e sua ingenuidade. Por sorte não sou profissional de crítica musical e posso descrever meus álbuns favoritos com comentários provavelmente insensatos e absurdos deste tipo.

Bob Dylan - Highway 61 Revisited

Este é o famoso disco de Dylan que abre com Like a Rolling Stone, faixa que, embora eu lhe reconheça os méritos e a importância histórica, não é exatamente uma favorita pessoal. Em Highway 61 Revisited, minha favorita atende pelo nome de Desolation Row, uma das melhores criações da faceta trovador-poeta-místico que talvez eu prefira à faceta trovador-dos-direitos-civis & discípulo de Woody Guthrie que Dylan assumiu logo no início de sua carreira e depois tanto penou para se descolar dela. “They're selling postcards of the hanging”, é esta a primeira frase da canção, cantada em um tom fatídico e ordinário que quase nos impede de assimilar o que acabou de ser dito, tom que praticamente não sofrerá modulação pelos próximos 11 minutos, por onde desfilarão Cinderella ("Bette Davis style"), o Corcunda de Notre Dame e o Fantasma da Ópera, Einstein, Ezra Pound e T. S. Eliot. Há algo que liga todos estes personagens, que parecem participar de um baile de máscaras surrealista e compartilhar de um mesmo destino, a herança derradeira de suas genialidades ou mera notoriedade entre os humanos; no todo, o baile é a caótica condensação por meio de alegorias do capítulo inicial de um livro que ainda está sendo escrito e ninguém sabe como vai terminar. Like a Rolling Stone é indomável e brilhante, é ao mesmo tempo cheia de futuro e de passado (já meio misturados, a essa altura dos acontecimentos, o que apenas acrescenta ao seu charme), mas Desolation Row é esfíngica e misteriosa, habita uma outra escala temporal e parece propor-nos um enigma, ou a resposta cifrada a algum enigma. E eu, de minha parte, vou sempre preferir os enigmas.

Dire Straits - Dire Straits

Por causa do Big Thief, conforme mencionado acima, tenho escutado muito aos discos do Mark Knopfler e do Dire Straits. Com o primeiro álbum do Dire Straits tenho uma relação de longuíssima data, repleta de memórias e afetos, porém, ultimamente, é uma anedota mais recente o que primeiro me vem a mente sempre que o ponho para tocar: a lembrança de que, alguns poucos anos atrás, estive com uma nova edição em vinil deste disco em mãos e decidido a comprá-la, mas no último momento desisti e deixei-o na loja em que me encontrava. O motivo, como sempre, o fato de que já estava levando muitos outros discos, e este eu já tenho. Não deve ter demorado muito para eu começar a me arrepender… Mas tudo bem: eu provavelmente queria apenas ter uma versão ampliada do objeto físico, talvez uma cópia de segurança para quando o meu velho CD deixar de funcionar, coisa que apenas por muita sorte (sorte da magnitude dos milagres, dadas às milhares de vezes em que ele foi manipulado) ainda não aconteceu, como pude constatar diversas vezes nos últimos dias. Sobre a música, não é necessário dizer nada, certo? Eu nem saberia o que dizer, de tão próximo que sou dela.

Comentários:

Não há nenhum comentário.

(Não é mais possível adicionar comentários neste post.)