Dying Days
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Discos do mês - Julho de 2025

Fabricio C. Boppré |
Discos do mês - Julho de 2025

Crédito(s): Tortura no Inferno, de Kawanabe Kyōsai, imagem copiada daqui.

Black Sabbath - Sabotage

Do meu totalmente irrelevante ponto de vista, o Black Sabbath é a mais importante de todas as bandas. Mais importante do que eles apenas aquele grupo anônimo de homens das cavernas que inventou o próprio conceito de música, conforme nos foi explicado no filme do Mel Brooks. Foi combinando certos ritmos, certas afinações de guitarra e certos temas que o Sabbath abriu a picada do metal em meio à floresta da música elétrica. Mas, principalmente: Tony Iommi, se não inventou, ao menos amplificou, como ninguém havia feito antes ou veio a fazer depois dele, o poder e a majestade do riff. Através de seus dedos e de sua imaginação, o riff tornou-se esplendoroso, mágico, um pequeno fragmento que fundia estranheza e êxtase como se fosse uma nova ciência. Como descrever After Forever? E Children of the Grave? Este elemento básico do rock 'n' roll é mérito de Tony Iommi sua transformação em algo que muitas vezes, na música do Black Sabbath, é ainda mais do que a essência de uma canção: muitas vezes é todo um universo em pouquíssimas notas, glorioso e auto-suficiente. Tudo isso para dizer que muito me entristeceu a morte do Ozzy, o dono da voz desesperada dos melhores discos do Sabbath, mas discordo dos tantos tributos que li nos últimos dias que associam a grandeza da banda majoritariamente ao seu primeiro cantor. Correndo o risco de soar indelicado (haja vista que, no momento em que escrevo, não faz nem uma semana da morte deste herói popular), devo dizer que considero essa avaliação bastante despropositada... Entendo a comoção, mas é injusta. O que a música do Sabbath tem de mais belo e eterno é de autoria de Tony Iommi. Estive escutando repetidamente ao Sabotage nos últimos dias; basta o disco começar, basta aquele início exaltado e descontrolado de Hole in the Sky explodir nas caixas de som para compreendermos onde reside a alma da banda. Sympton of the Universe decerto não seria a mesma sem a voz torturada de Ozzy, mas tenho plena certeza de que seu riff não deixaria de conferir a imortalidade ao Sabbath fosse outro o vocalista. Muito obrigado por tudo, Ozzy, e descanse em paz! Mas confesso que, antes de pegar um Blizzard of Ozz ou um Bark at the Moon para escutar, eu ainda prefiro qualquer um dos discos menos célebres do Sabbath nos anos 80 ou 90, um The Eternal Idol ou um até mesmo um Headless Cross...

Celtic Frost - To Mega Therion

Do primeiro disco do Black Sabbath (em 1970) até o Black Metal do Venom foram 12 anos. Então as coisas se aceleraram e, três anos depois, o Celtic Frost lança To Mega Therion. Em 1985 as porteiras do inferno estavam definitivamente escancaradas. É claro que, neste período, saíram muitos outros discos fundamentais para o gênero, mas percebo nestes três um caminho específico, o traçado mais arrojado que levaria às bandas e sonoridades que mais me interessam: o lado mais artístico e independente do metal, ouso dizer, feito para nichos e espíritos afins. Os primeiros álbuns do Iron Maiden, do Slayer e do Metallica, todos desta mesma época, contribuíram para o aumento no nível de atrocidade deste negócio do capeta chamado heavy metal — o aumento da agressão, do veneno, da velocidade e, claro, da iconografia satânica —, mas coloquemos assim: se eu frequentasse igrejas, To Mega Therion seria o alvo preferencial das minhas pragas. Iron Maiden, Slayer e Metallica encontraram seu público na multidão de jovens americanos sem futuro, no proletariado inglês cheio de rancor para desafogar; os fãs do Celtic Frost, por outro lado, estes têm algum outro problema. Estes eu tentaria desesperamente salvar. Porque tem algo de errado com esta música — quero dizer, algo de muito certo do meu real ponto de vista, o de alguém que só entra em igrejas para assistir a concertos de órgão. As guitarras são insidiosas, parecem um lancha-chamas apontado para o ouvinte; o cantor, Tom G. Warrior, parece sempre prestes a parar de cantar e cair na gargalhada. O restante da banda é pura energia maníaca, como que um Motörhead ressurgido no inferno, e não nos esqueçamos das trompas, que dão um toque tenebroso e surreal a um punhado de faixas. Se eu tivesse que escolher uma trilha sonora para o momento exato em que vieram abaixo as tais porteiras mencionadas no começo deste parágrafo, seriam estas faixas do Celtic Frost com trompas. É tudo malignamente divertido ou vice-versa, mas é, antes de tudo, anárquico e insubmisso, o disco anunciador (para o bem e para o mal) do black metal.

Da música que não é metal

Ah, sim, teve também. Nossas noites à meia luz têm sido frequentemente encantadas pela voz e pelo piano de Nina Simone, de quem confesso gostar mais da performance ao piano do que da voz, e não me surpreendeu nada ler recentemente que ela nunca quis ser cantora; Nina queria ser pianista clássica, estudou e treinou para isso, mas, sofrendo preconceitos e sabotagens sucessivas em suas ambições — era, afinal, uma mulher negra nos EUA dos anos 60 —, acabou sobrando-lhe apenas a opção de cantar e tocar em bares, e tão formidável era seu talento que ela acabou se tornando um ícone assim mesmo. Curiosamente, ando também escutando bastante ao pianista Friedrich Gulda, personagem em tudo inverso à Nina: homem branco austríaco, foi músico erudito quase que a vida toda, mas no fim, de saco cheio das rigorosidades e formalidades da música clássica, jogou fora o fraque e tornou-se pianista de jazz. Porém o Gulda que conheço e amo é o pianista clássico mesmo, principalmente aquele que gravou as sonatas para piano de Mozart. Tenho um box de seis CDs com estas gravações, e a alegria, meus amigos, digo-lhes que mora nestes discos. Uma vez ao ano, pelo menos, cumpro o ritual de atravessar a maratona completa. Em seus melhores momentos — no famoso Rondo alla Turca, por exemplo — Gulda parece uma criança esmurrando o piano, em extâse, em comunhão perfeita com o espírito de seu conterrâneo mais célebre. Saio feliz e renovado da audição de cada um destes discos. Suponho que seja, para mim, o que é o carnaval para a maioria das pessoas.

Comentários:

Sid | 05/08/2025

Quase levei uma cerveja na cara quando disse que Beatles e Sabbath são as bandas de rock mais relevantes e influentes.

Fabricio | 05/08/2025

Se eu estivesse nessa mesa, Sid, te jogaria a cerveja na cara por ousar colocar outra banda (qualquer que seja) no mesmo degrau do Sabbath.

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