Discos do mês - Novembro de 2016
Fabricio C. Boppré |Imagem principal:
Texto:
Steve Tibbetts - Safe Journey
Steve Tibbetts é minha mais recente paixão, tendo a coisa evoluído dos segundos iniciais da primeira audição exploratória, meio alheia e desatenta enquanto eu trabalhava, suavemente para uma readequação do ritmo respiratório e a convocação de todas as atividades cerebrais para que se concentrassem exclusivamente naquilo que eu ouvia, chegando finalmente à comoção profunda sem nenhum esforço, descansadamente, e acho que o disco que eu ouvia, este Safe Journey, não estava nem na terceira faixa ainda quando eu me dei conta disso tudo. Breve biografia: nascido nos EUA em 1954, Steve Tibbetts toca guitarra, violão e instrumentos de percussão diversos e lança discos desde 1977, a maioria deles colocada no mundo pelo venerável selo alemão ECM, aquele cujos discos começam sempre com um breve momento de silêncio. A música de Tibbetts é bela e pura demais para ser rotulada. É música que faz sentido e emociona antes de toda a cultura, de todo o cansativo conhecimento que vamos acumulando sobre as vulgaridades do mundo, de todas as consequências destes processos temporais aos quais estamos implacavelmente submetidos. É música para se ouvir com atenção e devoção, e a linguagem e seus labirintos nada podem fazer além de sabotar nossa capacidade de se deslumbrar com ela, portanto, paro por aqui, e sugiro que as pessoas se façam o infinito bem de escutar a este disco.
Bon Jovi - These Days
Eu já escrevi em outras ocasiões que eu gosto do Bon Jovi, certo? Então posso abandonar de vez os melindres e constragimentos que ainda me restam quanto a isso. O fato é que uma das peculiaridades da minha intensa paixão por música é a de reter por um tempo indeterminado o prazer de escutar aos discos que fazem parte da minha vida, reproduzindo quase sempre estes prazeres tais como eles eram lá no início, na origem da minha relação com eles (os discos), mesmo que isso signifique uma distância temporal de mais de 20 anos. Em outras palavras: eu nunca deixo de gostar de um álbum do qual eu já gostei em algum momento da minha vida. A estes não se aplica a evolução das minhas predileções — é como se eles se tornassem parte inviolável de uma espécie de galeria espiritual, uma paisagem interna sobre a qual não tenho absolutamente nenhum controle racional… Estes discos estão eximidos das exigências estéticas que se refinam com o passar do tempo, estão eternamente absolvidos. Sei dizer precisamente porque a música do Bon Jovi não me interessaria se a descobrisse hoje, sendo a pessoa que sou agora, com os meus interesses e a minha experiência acumulada atuais, mas em uma das etapas da minha vida eu fui fã da banda e gravei muitas fitas K7 com seus discos e as escutei incontáveis vezes, assim como uma boa parte da população do planeta fez a mesma coisa em fins dos anos 80 e começo dos 90, e é por isso que eu continuo escutando-os, por não haver se esgotado o prazo de validade daquele entusiasmo original nos tempos infanto-juvenis. Terei alguma espécie de síndrome de Peter Pan? Não os escuto mais com a mesma frequência, é evidente que não, mas não é raro eu voltar às boas companhias do Keep the Faith ou do New Jersey, álbuns que fazem parte de mim, da minha formação de melomaníaco e de colecionador de discos… São os meus dois preferidos, mas durante uns cinco ou seis dias seguidos lá pelo meio de novembro eu escutei ao menos uma vez por dia ao These Days, lançado em 1995, uma das trilhas-sonoras de que mais me recordo daquele ano, época em que eu me preparava para o vestibular que prestaria em janeiro seguinte. Àquela altura minhas atenções principais já se voltavam para outros cenários sonoros, mas um amigo com quem eu estudava diariamente para as provas ainda era um fã desavergonhado do Bon Jovi e havia recém-comprado este CD, e sempre que eu ia na casa dele para enfiarmos as caras nos cadernos, este era o disco que mais tocava. E é um bom disco de rock ’n’ roll este These Days, ouso dizer agora mesmo sem a parcialidade da herança de um vínculo pessoal mais forte com ele, e se o tipo de música que o Bon Jovi faz puder ser reduzido a algo bem específico e setorizado — soft-hard-rock, hard-pop-rock… alguma evolução etimológica e estilística do hair-metal, que havia sido devidamente aniquilado pelo furacão vindo de Seattle pouco tempo antes — então este disco há de ser um dos pináculos deste sub-sub-gênero. Não que seja este um grande título que vá lhe conferir um lugar nos anais da história da música… Talvez um elogio mais honesto seja: duvido que alguém que tenha escutando-o naquela época tenha se esquecido dos refrões de Something for the Pain e These Days. E Something to Believe In é uma grande música, isso creio que deve ser dito sem rodeios ou ressalvas de qualquer tipo.
The War on Drugs - Lost in the Dream
Outra ótima e tardia descoberta deste mês que passou (calma, gente, falta só mais um para terminar este ominoso 2016; não que exista qualquer perspectiva de um 2017 melhor, mas a essa altura a gente se apega a qualquer coisa) foi o The War on Drugs, banda que eu já tinha lido a respeito aqui e ali, porém nunca chegara de fato a colocar entre as minhas prioridades. Até que dias desses escutei o trecho de uma música deles em um vídeo da Amoeba Records, era mera música de fundo, executada durante uma entrevista, mas a coisa me tocou imediatamente. Encontrei para download este álbum Lost in the Dream — não façam isso em casa, crianças, é ilícito — e transformei-me imediatamente em fã da banda: que belo disco! Flui com uma beleza irresistível, calcado em um maravilhoso trabalho de guitarras, que são inegavelmente a alma da banda, prestando tributo a gente como Cure, Wilco e Neil Young pela maneira como estão sempre em primeiro plano a comandar o espetáculo, sem nunca abrir mão da delicadeza e da melodia. É aquele tipo de som, que parece se propor a nos redimir, por um momento que seja, das frustrações cotidianas. Definitivamente, não é uma boa decisão adiar muito a hora de escutar esses caras… E se algum representante da lei estiver lendo esse texto e já pensando em me encarcerar pelo crime abominável do download de arquivos MP3, fique tranquilo pois vou adquirir o CD assim que puder.
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