Dying Days
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Uma palavrinha sobre a polêmica Robert Smith/Radiohead

Fabricio C. Boppré |

Vários sites ressoaram as declarações do Robert Smith, onde ele chamava de "uma idéia idiota" o esquema das vendas do In Rainbows. Pois bem, a maioria dos sites reproduziu as falas do líder do Cure e acrescentou umas piadinhas e insultozinhos quaisquer. De fato, é bem fácil confundir a opinião do cara com uma inveja mal disfarçada para com o sucesso do Radiohead.

Daí o Robert Smith foi lá e publicou uma nova opinião no blog do Cure, rebatendo os insultos que recebeu e reforçando seu ponto principal, algo do tipo "dar música de graça é besteira pois como irão sobreviver os artistas?". Ele também tentou livrar o Radiohead, deixando claro que seus conterrâneos foram apenas um exemplo que ele escolheu. Mas ao longo do texto rola uma indireta ao Radiohead, sugerindo que eles só puderam fazer o que fizeram com o In Rainbows pois possuem uma grande base de fãs (oras!) e um grande estúdio por trás (aqui posso estar errado, mas o Radiohead já não tem um grande estúdio por trás --- a versão física de In Rainbows saiu na Inglaterra pela XL Recordings, um selo independente), e que tudo não passa de golpe de marketing. Bom, isso tudo é minha interpretação, o post está todo em letras maiúsculas, cheio de erros de digitação e ironias, e meu inglês não é nenhuma maravilha, mas me parece que o teor é mais ou menos esse.

Então, um pitaco meu sobre a questão. Primeiro, é lógico que a coisa não aponta para isso, para um mundo onde artistas não poderão cobrar por seu trabalho. Ninguém sugeriu isso, e se o Robert (por questões de conveniência, vamos tratá-lo assim mais intimamente) entendeu dessa forma o que fez o Radiohead, então décadas de gel no cabelo começam a cobrar seu preço, pois ele entendeu bem errado. Artistas têm que ganhar dinheiro, assim como quaisquer outros trabalhadores. O cara sendo um artista somente, a forma de se atingir esse objetivo é comercializando a sua arte e não há nada de errado com isso. Pelo menos enquanto vivermos num sistema capitalista, assim será.

Até aí tudo bem, poderia ser um mero problema de má-compreensão, mas no desenvolvimento de suas idéias, Robert começa a dizer bobagens. Algo o faz se achar no direito de julgar como cada banda deve ser recompensada pelo seu trabalho --- e eu lhe diria: meu maquiado amigo, nem ter gravado Disintengration e Pornography te dá esse poder. O cara que já foi até herói num South Park, aparentemente, acha que o artista deve etiquetar um preço em tudo que cria, e ao não fazer isso, não pode ser chamado de artista. É, o que define um artista como tal, para ele, é a competência em se colocar preço. A arte, e a forma como se faz chegá-la ao público, isso deve ser uma questão menor.

As perguntas óbvias: uma banda que já tem um séquito de fãs grande e fiel o suficiente, se achar justo que um aspecto de seu trabalho --- no caso, a música gravada em estúdio --- chegue sem custos aos fãs --- ou melhor dizendo, com o custo que estes acharem justo --- e que seus rendimentos venham de outras frentes, é menos artista então? Por que um esquema rígido, cujo funcionamento clássico teve como uma de suas consequências o surgimento destes impérios e conglomerados de "entretenimento", deve ser seguido à risca por todos?

O ponto é, o Radiohead chegou num estágio que pode fazer isso, pode escolher como comercializar sua arte, pode eventualmente abrir mão de milhões para fazer uma parte de seu trabalho chegar mais longe e mais fácil às mãos de quem os apoiou por tanto tempo --- e certamente, paralelo a isso, perder muito dinheiro não é algo que a banda queira. No fim das contas, eles só devem satisfação aos seus fãs, e tenho certeza que estes aprovaram o que a banda fez e deram seu suporte para que o esquema seja sustentável. Uma questão de confiança, sendo meio idealista. Afinal, mesmo no modelo tradicional, dar preço não cabe ao artista, mas aos selos e gravadoras --- e será que nós não somos ainda mais indicados para esta tarefa?

Mas eu não vi eles (Radiohead) em nenhum momento dizendo que todos devem fazer igual. E é óbvio que 99% das bandas ou artistas não podem fazer algo igual. Estes devem achar o melhor esquema para si, coisa que depende de várias circunstâncias. Podem vender sua música de forma independente num site com preço fixo ou variável, vender sua música por meio de um intermediário (estúdio ou selo, pequeno, médio ou grande), vender sua música do jeito que for por um preço módico ou alto, distribuir sua música de graça e cobrar somente por outros produtos (vídeos, shows, edições especiais de seus discos), enfim, qualquer coisa é válida. Afinal, quem vai dizer se a coisa está justa ou não somos nós, consumidores.

Se o Robert Smith acha justo que seus discos sejam vendidos no Brasil por 30,00 reais, tudo bem, está em seu direito. À essa altura, ele nem deve se importar com o fato de que no Brasil e em muitos outros países, muita gente não pode comprar um disco por esse valor, sem complicar demais seu orçamento mensal. E, alheio a isso, criticar quem inova, quem busca alternativas diferentes neste ambiente que mudou bastante com o advento da internet, é dar mostras de ter parado no tempo. Coisa da qual, convenhamos, não é muito difícil de acusar o Cure.

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